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O dia que cai no golpe da cueca velha
Bruxa Cientista – Edição #006
Um dos encontros da turma do Vox (o Francis está na minha frente).
Você já se viu em relacionamentos que pareciam destinados ao fracasso? Eu já, e costumava pensar que tinha um talento especial para escolher os parceiros errados.
Nao tinha simpatia de coar cafe na cueca que resolvesse (conhece?!). Meus relacionamentos pareciam destinados ao desastre.
Alguma vez você já sentiu o mesmo?
Eu era o que podemos chamar de "serial dater". Nao tinha isso de dar tempo para digerir o sofrimento. Uma relacao mal acabava e eu ja estava apaixonada por outro.
Passei por diversas temporadas de relacionamentos intensos e, finalmente, cheguei onde estou hoje: celebrando 18 anos com meu querido marido, Francis. Mas, isso significa que esses 18 anos foram perfeitos? Longe disso.
Antes de explorar como chegamos a construir um relacionamento sólido e saudável, permita-me compartilhar como tudo começou. Nossa história é uma daquelas que você gostaria de ouvir em uma mesa de bar, com uma cerveja gelada (ou sua bebida favorita) na mão.
Entao puxa uma cadeira que o boteco ja abriu!
Nossa História Imperfeita
Lembra-se do Orkut? Para aqueles com mais de 30 anos, essa foi uma das primeiras redes sociais com comunidades, e minha favorita era a comunidade de pessoas que detestavam acordar cedo, uma verdadeira pérola. Mas também havia um grupo de pessoas que frequentava um bar em Curitiba chamado VOX, e é aí que nossa história começa, em 2004.
Éramos cerca de 10 a 12 pessoas que sempre batiam papo nesse grupo. Até marcávamos encontros no bar, mas, na hora H, entre bebidas e flertes, não conseguíamos nos reconhecer. Cansada desse desencontro, decidi criar um evento, aproveitando o aniversário de uma das meninas do grupo, a Kelly.
Confirmamos a presença, todos estavam empolgados, mas, na hora, a Kelly não apareceu. Decidimos então ficar no bar e celebrar o aniversário dela sem ela. E foi nesse dia que conheci o Francis pessoalmente. Na época, ele estava ficando com uma amiga minha, Ana Paula, enquanto eu estava envolvida com outro rapaz da turma, o Alexandre.
Melrose Place, foto do site da ABC News
Se você assistia ao seriado "Melrose Place", talvez possa imaginar o que aconteceu a seguir. Mas duvido que consiga prever todas as reviravoltas que levaram ao famoso "golpe da cueca velha".
Depois desse primeiro encontro, começamos a passar muito tempo juntos. Era uma balada atrás da outra, festas, botecos, jantares. Essa farra durou quase um ano, até que algumas pessoas do grupo começaram a sossegar (ou seja, começaram a namorar sério).
No entanto, Ana Paula e Francis não foram um desses casais. Eles já tinham terminado o relacionamento. Enquanto isso, eu já tinha tido pelo menos sete paixonites ao longo do ano (sim, eu disse que era uma "serial dater").
O Maurício, que era o DJ do VOX, tinha uma banda de punk rock chamada "No Milk Today" e eles estavam prestes a gravar um CD. Todos nós fomos convidados para fazer backing vocal nesse projeto.
Na mesma semana, tive dias difíceis no trabalho e estava me sentindo muito chateada. Decidi que sairia naquela noite com o primeiro que aparecesse (não tenho orgulho do meu passado, ele me condena).
Contei meus planos ao meu melhor amigo, Francis, que respondeu: "Fabi, não faça isso. Depois você vai se arrepender. Vou comprar um vinho e vou até a sua casa. Vamos conversar e tudo vai ficar bem."
E assim foi. Francis, meu querido amigo, veio me consolar com vinho e conversa. Nada aconteceu! (Eu sei que sua mente já estava imaginando coisas.) Quando chegou a hora de ir embora, ele disse: "Fabi, bebi demais, não posso dirigir. Posso dormir aqui?"
Inocentemente, respondi: "Claro, o sofá está ali, você pode usar o travesseiro." Fui para o meu quarto e, meia hora depois, Francis estava batendo à porta, dizendo que não conseguia dormir no sofá, que era desconfortável, e me perguntou se poderia deitar na cama.
(Repito: nada aconteceu! Pare de pensar bobagens.) Eu, dessa vez, menos inocente, disse: "Claro que não. Você acha que eu nasci ontem? Nem pensar."
Foi então que Francis decidiu usar um golpe antigo, um que eu nunca tinha visto antes: o golpe da cueca velha. Ele abriu o cinto da calça e, sem nenhuma vergonha, baixou a calça (lembre-se de que ambos estávamos bêbados).
Eu disse: "Você está louco, Francis! O que está fazendo?" Ele apontou para sua samba-canção, de flanela velha e xadrez, e disse: "Você acha que, se eu realmente quisesse algo com você, teria vindo para sua casa usando essa cueca?"
Eu (ou talvez o álcool em mim) acreditei e respondi: "Ok, faz sentido. Pode deitar na cama. Mas mantenha distância."
O resto da história você já deve conhecer (ou pelo menos achou que conhecia). Mentira, eu te enganei. Nada aconteceu. Ou melhor, ele tentou, mas não teve sucesso. Em meio a viradas de um lado para o outro na cama, ele me beijou. Eu o empurrei, dizendo que éramos melhores amigos e que isso não funcionaria.
O final da noite: ninguém dormiu, ninguém se pegou (risos).
No dia seguinte, eu estava preocupada, lembrando do beijo, e pensando se perderia meu melhor amigo. Você sabe como é, aquele drama de "quero, mas não quero".
Chegou a hora de irmos gravar o CD do Maurício, e foi o Francis quem me deu carona. E assim, começamos a escrever nossa história. Inclusive, no Spotify, você pode ouvir o disco e, em uma das músicas, é possível ouvir claramente minhas gargalhadas! (Aqui o link)
Desde aquela gravação, passamos nossa primeira noite juntos, há quase 19 anos. Muita coisa aconteceu desde então. Vários dos casais formados na nossa turma de amigos se separaram, e muitas pessoas acharam que nossa relação era improvável, como Eduardo e Mônica da famosa música da Legião Urbana. As pessoas não acreditavam que iríamos durar.
Mas aqui estamos, nos aproximando dos 19 anos juntos em abril de 2024. O que torna nossa relação diferente de milhares de outras? Acredito que, ao longo do tempo, aprendemos a nos ver como pessoas reais, com qualidades, defeitos e vulnerabilidades.
Relacionamentos na Era Virtual
Você já deve ter ouvido falar de como as redes sociais mudaram a forma como nos relacionamos. No mundo do Tinder, muitos escolhem parceiros com um simples deslizar de tela. E-mails, mensagens de texto, selfies, nudes – dizem que a culpa da superficialidade das relações é das redes sociais. Será?
Ou será que estamos apenas encontrando a desculpa perfeita para as barreiras emocionais que criamos? Será que temos medo da realidade e, em vez disso, estamos vivendo paixões que são o resultado de projeções?
A Dra. Helen Fisher fez um TED Talk sobre relacionamentos e tecnologia. Sua pesquisa fala sobre as diferenças bioquímicas e como elas afetam nossos relacionamentos. Ela menciona o que chama de "padrões de atração". No entanto, sua pesquisa também nos faz refletir sobre o paradoxo da escolha. Cientificamente, é chamado de "cognitive overload". Quando temos mais de nove opções, ficamos bloqueados, temos dificuldade em fazer uma escolha. É como se quiséssemos encontrar a escolha perfeita e, assim, não fizéssemos nenhuma.
Arrisco-me a ir além e dizer que, inconscientemente, não nos permitimos amar verdadeiramente alguém. Relacionamentos reais só acontecem quando as projeções acabam.
Projeções e Expectativas em Relacionamentos
A maioria das histórias de amor começa com uma paixão. Paixões são, por natureza, projeções. Todos nós temos estruturas inconscientes chamadas de animus (para mulheres) e anima (para homens). Essas partes inconscientes representam ideais de perfeição que consideramos ideais para cada pessoa.
No entanto, relacionamentos de longo prazo não podem ser sustentados por projeções. Precisamos enxergar a pessoa por trás dessa idealização.
As estruturas sociais em que estamos inseridos nem sempre ajudam. Crescemos ouvindo contos de fadas que, por mais que pareçam bobos, têm um impacto profundo em nosso inconsciente pessoal. Além disso, nossos exemplos de relacionamentos, sejam dos nossos pais, amigos da família ou outros casais, moldam padrões internos do que consideramos um relacionamento saudável.
O que aprendi ao longo de quase 19 anos juntos é que, se quisermos um relacionamento verdadeiro e sólido, precisamos ver nossos parceiros como pessoas reais, com todas as suas qualidades, defeitos e vulnerabilidades.
A Realidade do Amor Não Tem Uma Cor Única
Nos primeiros anos com Francis, eu não me sentia amada. Na verdade, eu pensava que ele tinha ficado comigo por senso de responsabilidade (ou, como chamamos, o "Pedro"). Em outra newsletter, vou contar sobre minha gravidez, que também tem uma história interessante, incluindo uma aparição espiritual.
Eu cresci em uma família em que o amor era expresso com presentes e palavras. Meu pai sempre fazia grandes gestos românticos, dignos de um filme. Aprendi que isso era amor. Um carro no jardim com um grande laço vermelho, rosas vermelhas fora de datas especiais, café na cama, muitos cartões.
Em uma de nossas discussões nos primeiros anos, lembro de dizer: "Você não me ama! Nunca me dá cartões!" .Meu marido, que tem a linguagem do amor voltada para o serviço, não entendia nada.
Afinal de contas, ele sempre pegava as toalhas molhadas e as xícaras sujas que eu deixava pela casa. Além disso, ele também não se sentia amado, afinal de contas, eu dava presentes e cartões, mas não limpava a casa.
Brincadeiras à parte, ninguém nos ensina que a realidade do amor não é toda cor-de-rosa. Ou melhor, pode ser, mas existem muitas outras cores. Isso é o que chamamos de "linguagem do amor". As pessoas expressam e recebem amor de formas diferentes.
Relacionamentos reais exigem pessoas reais. Pessoas reais são vulneráveis. Pessoas reais erram. Este, provavelmente, foi o meu maior aprendizado em quase 19 anos juntos: se quero uma relação verdadeira e estável, preciso ver meu marido como um homem real. Para fazer isso, precisamos ter clareza sobre nossas expectativas irreais e aprender a separar essas expectativas da realidade.
O Que Aprendi em 19 Anos de Relacionamento
Eu e meu barbudo favorito
Não sou uma coach nem uma especialista em relacionamentos amorosos, mas este é o meu segundo casamento. Além disso, já fui uma "serial dater", como mencionei antes. Hoje, olhando para o meu passado, consigo identificar claramente vários erros e alguns acertos.
Primeiro, pode parecer óbvio, mas tenha valores semelhantes. Você e seu parceiro podem ser pessoas bem diferentes, como eu e Francis, mas a visão de mundo e os valores que orientam suas vidas precisam estar alinhados.
Em segundo lugar, não coloque a chave da sua felicidade no bolso do seu parceiro. Ninguém consegue ser responsável pela felicidade do outro. Se você não consegue ser feliz sozinho, não conseguirá ser feliz em um relacionamento.
Terceiro, não viva em função do relacionamento ou do outro. Mantenha uma vida própria que independa do relacionamento. Continue se desenvolvendo como pessoa e cultive hobbies próprios.
Apesar do aprendizado anterior, procure sempre ter atividades que vocês gostem e possam fazer juntos. Muitas crises em nosso relacionamento surgiram devido à rotina, ao trabalho e aos filhos.
Por último, não sonhe com uma relação perfeita, porque elas não existem. Relacionamentos são feitos por pessoas, e todos nós somos imperfeitos por natureza. No entanto, isso não significa que você deva se acomodar. Relacionamentos exigem tempo e atenção.
Nesta edição, compartilhei um pouco da minha jornada com meu marido, desde como nos conhecemos até como aprendemos a linguagem do amor um do outro. Também compartilhei os principais aprendizados que adquiri ao longo desses quase 19 anos de relação.
Agora quero ouvir suas histórias de amor. O que você aprendeu com seus relacionamentos? Há algo mais que você acrescentaria a essa lista? Compartilhe suas experiências, pois juntos podemos aprender e crescer em nossos relacionamentos.
Favoritos da semana 🏆
Leitura: Um dos meus livros favoritos deste ano é o Mito do Normal do Dr Gabor Matte. Saiu em português faz pouco tempo. Ele fala sobre como vivemos em um mundo doente (Oi Renato Russo!) mas "fingimos" normalidade. O preço disso é a nossa saúde mental.
Seriado: Você já deve saber que adoro mitologia. Apesar de ser um seriado meio juvenil, eu curti a nova temporada do Ragnarok. O legal é que você aprende um pouco mais sobre a mitologia nórdica assistindo. Está passando na Netflix (é bem teenager, mas eu curto).
Histórias para dar risadas: Não sou só eu que passo vergonha. Aqui em casa temos um vício noturno. Assistir as histórias que as pessoas contam no quadro do Porchat chamado "Que história é essa Porchat". A nossa favorita até hoje é essa aqui. Essa mulher não sabe, mas ela nasceu para contar histórias! A gente riu de ficar com dor de barriga rsrs.
Beijocas e até a próxima edição,
Fabi Ormerod
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